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Como Nasce uma Pomba Gira


Carmem vagava pelas ruas sem saber para onde ir. Perdera os pais quando tinha cinco anos, e fora morar com seus tios. 
Tratada  como escrava em casa deles, nunca soube o sentido das palavras felicidade, carinho,amor. Analfabeta, conhecia apenas os segredos da cozinha e da faxina que era obrigada a fazer diariamente.

O assédio de seu primo tornava-se insuportável  à medida que crescia em formas e beleza. Tanto o rapaz insistiu que acabou tirando sua virgindade. Foram flagrados na cama por sua tia, que em momento nenhum duvidou da palavra do filho, de que fora ela quem o seduzira para obrigá-lo a se casar com ela. Ora, isso a orgulhosa mulher jamais admitiria, ver seu filho casado com uma órfã analfabeta sem eira nem beira. Carmem foi posta na rua sem um tostão e apenas com a roupa do corpo.
Agora estava ali, mais desvalida do que nunca, sem um teto sobre a cabeça, perambulando por ruas que não conhecia, em uma noite escura e fria, lágrimas escorrendo por seu lindo rosto. Um rapaz se aproximou dela e perguntou o que uma moça tão bonita fazia por ali, e porque chorava.
Carmem achou que ele tinha um aspecto bom e compreensivo. Desalentada, contou-lhe sua triste história. Nada tinha a perder. Quem sabe aquele rapaz não a ajudaria/ Fora o único ser humano a demonstrar interesse por seus sofrimentos, em todos os seus 17 anos de vida. Após ouvir tudo ele disse, venha comigo, tenho um lugar para você ficar! Sem outra opção, Carmem o seguiu.  Entraram em um casarão escuro em que somente uma pequena luz vermelha alumiava. Uma senhora vestida e maquiada com extravagância os atendeu. Outra menina, Jorginho? Perguntou. E o rapaz disse para a cafetina, essa é minha e vai dormir somente comigo, eu vou pagar para que seja somente minha.
A partir dessa noite, Carmem tornou-se uma das meninas da famosa Madame Eglantine. A princípio deitava-se com Jorge apenas por gratidão, mas aos poucos se apaixonou pelo rapaz, que em pouco tempo enjoou do que havia conseguido com facilidade. Um dia o rapaz foi ter com a Madame e disse, já está na hora da garota começar a fazer a vida, não tenho mais como pagar sua estadia aqui. Madame Eglantine sorriu com desdém, era sempre assim que acontecia.
Ao ser informada de que agora teria de atender aos clientes, tal como as outras, Carmem desesperou-se e chorou muito. Sem ter como fugir da situação, à noite foi para o salão. Sentada no grande salão mal iluminado, usando um vestido vermelho justo e decotado, Carmem aguardava a hora de algum homem abordá-la.
Em dado momento Madame Eglantine apareceu com um senhor já idoso e lhe disse, querida, trate muito bem o Comendador Belisário, ele é prata da casa! Ao olhar o homem Carmem sentiu náuseas, ele podia ser seu avô!  Madame Eglantine percebeu e lhe ordenou, leve-o para o quarto e faça tudo o que ele quiser. 
Com os pés vacilantes ela subiu as escadas, puxando o Comendador pela mão.  O velho fungava em sua nuca e ela, ao sentir seu hálito mal cheiroso, o empurrou com violência. Isso excitou ainda mais o Comendador, que agora babava em seu pescoço. Cega pelo desespero, Carmem agarrou a haste de bronze de um abajur próximo e golpeou com ódio a cabeça de Belisário. O velho, tomado de ira, apertou o pescoço da moça até que, com os olhos vidrados e roxa, ela caiu morta aos seus pés. Assustado pélo que fizera e meio tonto pelo golpe que tomara, o velho rolou escada abaixo e caiu morto no meio do salão de Madame Eglantine.
Durante muitos anos, o espírito de Carmem vagueou por regiões escuras e umbralinas, até ser resgatada por benfeitores espirituais que cuidaram dela, e se transformou na Pomba Gira Dama da Noite, uma entidade da Umbanda.
( Nota: Pomba Gira é um nome genérico dado aos espíritos de mulheres da vida, cortesãs e outras, que trabalham na Umbanda. Quase todas têm uma história terrena trágica, como a dessa entidade. Em breve postarei outras histórias no site. Eclarecendo aos leitores que eu não sigo uma religião específica, mas creio que Deus é um só Pai, e respeito todas as crenças que conduzem aos caminhos do bem e da luz. )
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Autor Patrick Neves

O tipo bom de má companhia...

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